quarta-feira, abril 29, 2015

COTIDIANO URBANO

Era uma esquina como outra qualquer. Cada um estava de um lado da rua. Ela seguiu na direção dele quando o semáforo se abriu. Ele ia a passos calmos se aproximando dela. Eles se olharam nos olhos, como raras vezes acontece nas cidades grandes. Estavam cada vez mais próximos até que... passaram um pelo outro e seguiram em frente na vida...

quarta-feira, abril 08, 2015

DIFUSÃO SIMPLES

O sorriso se abria
como se escapasse
com pressa de não ser pego
pelos cães de guarda da razão.

Era sol de domingo
ou outro motivo simples?
Perguntavam sem compreender.

Era osmose e nada mais.
Interior cheio, exterior vazio.

terça-feira, abril 07, 2015

PALAVRAS DE HORTELÃ

"Eu sei bem, princesinha, que você gostaria de ser sabor tutti-frutti. Mas você é hortelã. É você me refresca, meu bem! O verde é uma cor que te traz tanta harmonia..."

Ela parou de traduzir a letra daquela canção e começou a rir. Sério que aquela música tão bonita estava dizendo aquilo? Aquela musicalidade toda... e a letra era assim? Não sabia falar francês e quando se aventurava numa música francesa, encontrava esses versos?

Indagou-se por onde deveria andar o glamour. Teriam notícias dos poetas sensíveis? Ela só precisava de uma frase realmente bonita, para concluir seu livro de citações. Mas... cadê?

Cansada, decidiu ir dormir. Precisava descansar. Na cama, enquanto relaxava, uma frase lhe surgiu, como que uma inspiração. Era realmente uma frase bela. Encaixava perfeitamente com o que precisava, excetuando por um detalhe: não era uma citação, mas uma criação. Contudo, era uma frase tão bonita... Não poderia simplesmente ignorá-la...

Na manhã seguinte, acordou decidida: escreveria outro livro, apenas para incluir a tal frase. Enquanto não encontrasse a citação perfeita para concluir seu atual trabalho, iria dar início já ao seu novo projeto. O mundo precisava daquela frase, mas haveríamos de esperar a obra ser concluída. A palavra dita fora de contexto seria forte. Mas ela queria algo realmente avassalador. Não bastava um suco de abacaxi para refrescar o calor das almas: haveria de colocar nele algumas folhas de hortelã...

O FUTURO DÁ DOIS PASSOS A FRENTE

Um dia normal, como outro qualquer. Ele levantou da cama, se arrumou apressadamente e saiu. Três minutos depois, estava dentro de um ônibus lotado, que balançava seu corpo e chacoalhava sua mente. Sentia que, a qualquer momento, o movimento do ônibus faria sua mente despedaçar e ser corpo ruir, como se fosse feito de cinzas de cigarros. Lembrou-se da companhia dos amigos e de cada cigarro com eles fumado. Teve vontade de acender um ali mesmo, mas não podia. Não agora. Deixaria aquele pequeno momento de prazer para depois.

Decidiu pensar em como lhe foi agradável o último fim de semana. Conversa com amigos, momentos para descansar. Até o tempo estava agradável: nem frio, nem calor, nem chuva, nem sol. Sentia que aqueles momentos deveriam ser mais frequentes em sua vida. Aliás, sentiu que aqueles instantes eram os únicos nos quais ele vivenciava algo que ele poderia chamar de vida, para ser honesto. No restante do tempo, ele apenas sobrevivia. Como seria bom se sua vida fosse diferente. Mas não podia simplesmente mudá-la. Tinha que trabalhar, afinal. Quem sabe quando estiver aposentado...

O certo é que tudo parecia algo distante, a caminho de se atingir. O presente parecia ser roubado dele e ele haveria de se contentar apenas com as possibilidades futuras. Mas a cada passo que ele dava na direção de alcançar seus objetivos, ele os via se afastar um pouco mais. Era como se corresse atrás de uma miragem ou como ver o benfeitor recolher a mão e ir embora. Pensar naquilo tudo era muito triste e era melhor não pensar nisso logo agora de manhã. Era melhor deixar pra depois e tentar começar o dia de forma mais alegre.

Percebeu que o ônibus fazia um desvio em seu caminho. Parece que um acidente impedira o trânsito naquela avenida. Como desceria 4 pontos a frente na tal avenida, pediu para descer e foi caminhando para o seu destino. Logo ao desembarcar, acendeu um cigarro, olhou o relógio e pôs-se em direção ao seu destino. A cada passo, sua cabeça se esvaziava ainda mais. Queria ser mais vazio e não aquele ser cheio de turbulências. Mas isso teria que ficar pra depois. Estava atrasado e precisava se concentrar na velocidade de sua caminhada. Ele tinha pressa pela pressa que os outros tem por ele. Agora ele era da empresa em que trabalhava. Seus planos para si ficariam para depois.

Quando o cigarro acabou, jogou a bituca apagada numa lixeira. Sentiu-se inerte por um momento, contemplando seu ato de abandono. Mas cigarros são assim: haveria de surgir outro para substituí-lo. Esse seria um prazer futuro. Agora, era hora de caminhar. Mecanicamente, passo a passo, seguir em frente. Porque é preciso ir.