sábado, novembro 30, 2013

TRAVESSIA E ARES

Eu caminhava lentamente para frente e, às vezes, olhava pra trás para ter certeza de que a janela não havia se fechado e os olhos continuavam a me proteger com sua força invisível. Os passos eram duvidosos e parecia que, a qualquer momento, tudo poderia desabar. Não havia medida para o medo, que me parecia engolir num precipício sem fim.

Contudo, a coragem fez morada na minha alma, me deu combustível para as minhas pernas e eu segui em frente. Analisei o risco e fiz o que tinha que fazer: atravessei a rua. O chão era duro, a noite era fria, as pessoas passavam se esbarrando sem nem mesmo se importar.

Então era só questão de tempo até eu me acostumar a caminhar sozinho e começar a querer, quem sabe um dia, te tirar do outro lado da calçada.

quinta-feira, novembro 21, 2013

C. FAMILIARIS

E ela me imitava
nos pequenos detalhes.
E eu sempre sorria
pelas pequenas coisas.

E quando ela pulava em meu colo,
ou eu lhe chamava a atenção com vontade de sorrir,
eu sabia que havia ali nascido um amor.

domingo, novembro 17, 2013

FARTO

Era o fim de uma tarde.
O rato saiu à caça do gato.
Seguia pelo faro a trilha ao encontro.
Hoje era uma noite de revanche.

BK

Sentado pra sonhar.


Os pés forçam
a corrente forte
que me liberta.

O vento vindo
no rosto satisfeito.

Duas rodas
são, na verdade,
duas asas
para mim.

quinta-feira, novembro 14, 2013

SE JOGA

Fazia muito tempo em que ela pensava nessa ideia fixa e aquela noite era a ocasião perfeita para realizar seu intento. Não havia muito a perder e sinceramente ela já não aguentava mais fugir disso. Esta era a hora de transformar sua ideia em ação.

Era noite de sexta-feira e seus parentes viajavam. Ela estava sozinho em casa. Poderia sair sem ser notada. Seus amigos deveriam estar se aprontando para sair e se divertir. Provavelmente não encontraria ninguém durante a pequena caminhada que faria até seu destino.

Andava a passos apressados por ruas escuras daquela cidade, em busca do que queria. Conseguiu vê-lo de longe e foi atraída em sua direção por uma força irresistível.

Chegou ao viaduto mais antigo da cidade. Ele ficava sobre os trilhos do trem e permitia a passagem dos carros, dos ônibus e dos caminhões sem que houvesse congestionamento. Ela olhou lá para baixo e não teve dúvidas: pulou lá de cima num só movimento.

Sentia o ar bater violentamente contra sua pele. Mas ainda assim não sentiu medo. Apenas uma alegria crescente que foi tomando conta dela até que se sentiu suspensa no ar. Parecia que a gravidade havia cessado. Abriu os olhos, que agora não tinham que enfrentar a fúria da resistência do ar, e viu tudo mais iluminado que de costume. Estava no meio da altura da queda, pairando no ar.

Seu corpo não era mais pesado. Tudo era leve nele. Nada conseguia lhe prender ao chão. Ela estava livre, afinal! Por alguns segundos, aproveitou aquela nova sensação, de não ter peso em si, de sentir-se um com o ar.

Depois, percebeu que não conseguia movimentar nada além de seus braços, pernas e cabeça e, por mais que o fizesse, não sairia do lugar. Agora lhe cabia um castigo pior do que estar presa ao chão por seu próprio peso. Sua prisão era sua leveza, a sua liberdade.