quinta-feira, dezembro 23, 2010

CINDERELA


Ela bebia alegre com os amigos num bar depois de um longo dia de trabalho. Havia mudado para São Paulo havia poucos dias. Era advogada e por isso usava salto alto, roupa social e maquiagem para trabalhar.
O papo fluia sem preocupação e a bebida se esvaziava facilmente na mesa. Muitas gargalhadas, brindes, assovios para o garçom.
De repente ela olha o relógio e descobre que já são cinco para a meia-noite. Despede-se às pressas das pessoas, tira os sapatos e sai correndo. Na correria, ela deixa um dos pés de sapato cair, mas não volta pra buscar. Tira o bilhete da bolsa e ultrapassa a última catraca do metrô que ainda estava funcionando.
Agora já do lado do embarque, senta-se em um dos bancos e acende um cigarro. Um homem que já estava sentado num assento próximo pergunta pelas horas.
E assim ela conheceu seu príncipe encantado.

segunda-feira, dezembro 06, 2010

SINAL VERDE


Ela foi atropelada na minha frente. Foi como se tudo estivesse em câmera lenta. O sinal verde para os pedestres e uma moto que veio buzinando...
Caia uma fina chuva, triste talvez. Fiquei sem saber se parava para ajudar ou se corria para o outro lado antes que o sinal abrisse e os carros arrancassem...
Algumas pessoas começaram a gritar, indignadas. Curiosos surgiram de todos os lugares.
Com medo, atravessei a rua e fui embora, sem saber como a história terminou.

sábado, novembro 27, 2010

ESTÁ NOS OLHOS


- Onde estão seu pai e sua mãe?
Caio era apenas um menino de 8 anos. Brincava na rua quando um homem lhe ofereceu uma bala. Ele não aceitou pois sua mãe pediu para não conversar nem aceitar nada de estranhos. O homem, porém não desistiu de importuná-lo.
Tirava fotos de longe de Caio brincando na praça. Aproveitava que a babá estava muito mais preocupada com seu irmão mais novo para tentar novas aproximações. Foi atrás dele na escola uma vez, dizendo-se um tio que há muito tempo não o via. As professoras, desconfiadas impediram o contato entre os dois. Depois disso, o homem desapareceu, nunca mais foi visto.
Alguns meses depois, Caio foi com os pais num parque da cidade. Estavam pai, mãe e filho na fila da roda gigante quando caio soltou as mãos da mãe e saiu correndo. A mãe assustada correu atrás do menino. Quando o alcançou, ele disse a ela;
- Olha que tanto de meninos, mamãe!
A mãe olhou e realmente eram fotos de crianças. Estava dianta de uma exposição intinerante de um fotógrafo iniciante. As fotos não mostravam o rosto das crianças, mas a mãe havia identificado Caio numa delas pelo gesto que foi fotografado: uma mão de criança com os dedos cruzados segurando um carrinho e empurrando-o contra um boneco. Era um gesto que ela já tinha visto o filho fazer outras vezes, principalmente o detalhe de cruzar os dedos.
A exposição mostrava crianças fazendo gestos, a principio agressivos, mas que não passavam de brincadeira de criança. O título era: "A maldade".

quinta-feira, novembro 25, 2010

O PIANO FRANCÊS


Aquele piano estava naquela casa fazia quase 120 anos. Já tinha vivido muitas histórias e já havia produzido muita melodia. Era, ainda, um instrumento imponente e recebia cuidados atenciosos que justificavam sua longa vida.
Viera da França como um presente para um menino de apenas 5 anos. Na época, os pais descobriram que o filho tinha um dom precoce para a música e quiseram incentiva-lo adquirindo tal instrumento. Quem sabe não seria ele o próximo gênio da música clássica mundial?
O piano foi muito utilizado até o menino completar 18 anos. Nesta época, ele se alistou no exército e quase abandonou a música. Tocava apenas quando estava de folga, para impressionar a namorada. Cinco anos depois, numa das batalhas, veio a falecer deixando sua mulher grávida de uma menina e um menino.
Os filhos nasceram e aos quinze anos a menina começou a se interessar pelo piano. No início, sua mãe não queria que ela tocasse. O piano lhe fazia lembrar o marido. Mas, depois de tanta insistência, a menina começou a receber aulas em casa. Ela tocava com tanta graciosidade que sempre era o centro das atenções, quando a mãe lhe pedia para tocar para alguma visita.
O seu professor de piano era um senhor de 58 anos que se apaixonou pela jovem aprendiz. A jovem não queria nada com ele. Estava interessada no filho da empregada, a quem ela ensinava algumas das lições aprendidas no piano, quando tinha tempo livre.
O irmão dela percebeu o envolvimento entre os dois e denunciou à mãe. Ela despediu a empregada, que foi embora levando o filho.
A moça passou a tocar músicas melancólicas ao piano até que, cinco meses depois, fugiu com o filho da empregada.
A mãe, muito desgostosa, queria queimar o piano, que só lhe trazia lembranças ruins. Seu filho, porém, não deixou que isso acontecesse. Afinal, era a única coisa de concreto que ele tinha a respeito do pai. Aquele piano, de uma certa forma, fazia parte da identidade daquela família.
Os anos se passaram e o rapaz tornou-se um estudante de filosofia. Conhecia muita gente e por influência dos amigos acabou entrando para o Partido Comunista. No ano seguinte, instaurou-se uma ditadura sobre o país e o piano, que estava esquecido há algum tempo, passou a ser novamente usado. Era tocado em reuniões clandestinas, que aos vizinhos pareciam festas realizadas na casa do rapaz.
Numa dessas reuniões, tiveram a ideia de usar um código para comunicação secreta utilizando partituras para piano. Assim, eram compostas no piano músicas que não faziam sentido musical, mas que tinham um significado oculto.
Em dois anos, os grupos resistência conseguiram se articular por meio das mensagens codificadas e derrubar o ditador. Assim, o nosso jovem estudante de filosofia se tornaria ministro da educação do novo governo.
O velho piano continuava na mesma sala de sempre e agora animava festas de verdade que contavam com a presença de embaixadores e pessoas do alto escalão. Numa dessas, a maestrina da orquestra da cidade se interessou em comprar o piano, mas o ministro não quis vender. A insistência dela não fez o ministro mudar de ideia, mas possibilitou que os dois conversassem bastante, se conhecessem e se apaixonassem.
Os três filhos dos dois cresceram em torno do piano. Todos aprenderam a tocar, mas nenhum tinha gosto em ser músico.
Somente o primeiro neto é que resolveu seguir carreira musical. E se tornou o maior pianista contemporâneo. Tocou com várias orquestras, correu o mundo, tornou-se um ícone.
Porém, infelizmente, faleceu aos 23 anos num trágico incêndio que consumiu também a casa da família e o velho piano francês. Apenas as lembranças dos amigos sobre as histórias do famoso pianista e seu piano ficaram a salvo do triste e ardido fim.

segunda-feira, novembro 22, 2010

AUDÁCIA


Estava um dia terrível. Um sol morno, num céu azul, poucas nuvens alvas, temperatura em torno dos 20 graus. Ninguém queria sair de casa, tamanho mau tempo. e para piorar as coisas, algo repulsivo estava acontecendo.

Todo mundo fechava as janelas com raiva. Aquilo não era possível. Uma menina de dez anos passava na rua em plena tarde escutando música clássica! Será que ela não tinha vergonha? Onde estariam os pais dessa menina? E quem diabos deu a ela um mini system que podia funcionar a pilha?

Ela dançava, como se estivesse num baile antigo, enquanto caminhava pela calçada. uma barbaridade. Quem teria ensinado tão imoral dança àquela pequena? Como se não bastasse, para completar a afronta, ela usava fitas coloridas no cabelo. Era preciso fazer alguma coisa.

Depois de longos e custosos 30 segundos, finalmente um carro da polícia apareceu e levou a menina para uma delegacia. Durante o interrogatório, ela não dizia nada, não respondia o que lhe era perguntado. Quanta audácia!

Resolveram que ela deveria receber a merecida pena de morte por overdose de gás do riso. Morreria sorrindo, sofrivelmente até perder as forças.

quarta-feira, novembro 17, 2010

A OUVINTE


Ela já havia passado dos cinquenta anos. Vivia sozinha em seu apartamento e não saia para praticamente nada. Era aposentada e apenas fazia as compras que precisava, assistia TV e ouvia os vizinhos.
Sim, seu passatempo favorito era ouvir os vizinhos. Escutava ruidos que vinham dos apartamentos próximos e ficava imaginando, através do barulho, o que estava acontecendo. Assim, surgiam histórias variadas.
Um chuveiro denunciava um banho para sair com a namorada. Barulhos de salto vindos do apartamento de cima contavam que a moça iria a uma festa nesta sexta-feira. Gritos e uma porta se batendo com força acusavam a briga do casal do andar de baixo. Pelos sons ela descobriu que o gato da síndica havia fugido e fora parar no apartamento ao lado, de onde o cachorro o fez sair rapidinho. Ouvira também o choro da nova vizinha da frente e descobrira que ela terminara o namoro.
Os sons preenchiam a vida dela. Seu ouvido também se tornara uma janela para o mundo. Tanto que fazia tempo que ela não escutava música no rádio, que era para ouvir possíveis ruidos que lhe trariam novas história.
Foi numa dessas que ela encontrou algo realmente notável. Uma voz daquelas de cantor lírico cantava trechos de uma ópera antiga da qual ela gostava muito. Passava, de vez em quando, pelo corredor no meio da tarde.
Ela resolvera, naquele dia, espiar pelo olho mágico e descobrir quem era o dono de tão bela voz quando ele passasse em frente a sua porta. Que surpresa: era o porteiro quem cantava enquanto entregava as correspondências!
Ela não tinha intimidade com ele, mas resolveu arriscar uma forma de, quem sabe, garantir uns segundos a mais de cantoria.
No dia seguinte, o porteiro passava no corredor no horário de sempre quando encontrou uma xícara de chá de erva-cidreira numa bandeja com biscoitos e um bilhete que dizia: "para o cantor de ópera". Num primeiro momento, ele ficou desconfiado e resolveu deixar tudo como encontrara. Mas no fim do dia a fome apertou e ele resolveu arriscar o desfrute do presente inesperado e anônimo.
Assim, todos os dias ela ficava escutando todos os ruidos e também trechos de óperas variadas. Assim, todos os dias ele passava cantarolando no corredor como a retribuir a adimiração recebida.
Um dia ele resolveu descobrir quem era que lhe preparava os agrados de cada dia. Resolveu investigar à sua forma: iria procurar pelo barulho de uma chaleira que estivesse ao fogo um pouco antes do horário habitual da entrega das correspondências. Se as paredes daquele prédio tivessem ouvido, elas haveriam de entregar a identidade da sua admiradora secreta!

quinta-feira, outubro 28, 2010

DAS ALMAS


Quem não acredita em vida após a morte?
Eles eram quatro amigos desde a adolescência. Naquela época, eram um bando de desajuizados. Viviam bebendo e farreando. Até aquela noite fatídica.
Como de costume, beberam muito, pegaram o carro do pai de um deles e sairam sem rumo. No meio do caminho, alguém teve a ideia de ir a uma cidade próxima e foram na direção do viaduto que ligava os dois municípios.
Dentro do carro, ouviam Mettalica, cantavam, bebiam e riam muito. E a velocidade só fazia aumentar.
De repente, enquanto zigue-zagueavam pela contramão já sobre o viaduto, um caminhão apareceu também a toda velocidade. O som forte da grave buzina ressoou nos ouvidos deles por alguns segundos, as luzes dos faróis cegaram a todos.
Naquele instante, cada um viu passar diante de si cada segundo de suas vidas. Gritaram com todas as forças, esquecendo-se, talvez, que o grito de nada adiantaria naquela hora.
Morreram todos naquele dia. Nenhum sobreviveu. O impacto fora muito forte. Todos renasceram no instante posterior, quando o caminhão passou a poucos milímetros do carro. Eram agora pessoas novas, renovadas pela quase- morte.
Exatos doze anos depois, souberam pela televisão que aquele viaduto seria desativado. Estavam construindo um acesso mais seguro entre as duas cidades. Decidiram então fazer uma última visita ao viaduto que havia matado os adolescentes irresponsáveis e que fez nascer os homens que se tornaram.
Entraram no carro de um deles e foram para lá, ouvindo no rádio uma música dos Beatles. Sorrisos serenos e papos relembrando os velhos tempos. Chegando a beira do viaduto, pararam o carro no acostamento e desceram para contemplar mudos o por-do-sol. Foi uma celebração à lembrança, à vida. Em frente estava o lendário viaduto, que seria implodido na próxima semana. Seria sempre o viaduto da morte. O viaduto da vida. O viaduto deles. Sim, era deles o viaduto. Era das almas que renascem.

segunda-feira, outubro 25, 2010

AMANHÃ OU DEPOIS


Ela queria muito pintar um quadro, mas naquela manhã já tinha um compromisso urgente. Ficaria para outra vez.
Passou um dia, uma semana, um mês, quase um ano! Porém, o desejo pela imagem não sumia. Tivera a ideia a partir de uma imagem que vira num sonho: uma pomba sobre a cabeça de um leão. O leão, por sua vez, sobre um edifício ao por-do-sol.
Pintaria no feriado prolongado, estava decidida. Porém, os filhos e o marido requisitaram toda sua atenção, enquanto o feriado lhe escapava por entre os dedos. Quem sabe nas férias...
Um ano, dois anos, dez anos, vinte anos se passaram. A inspiração já tinha ido embora, mas ela permanecia firme no intuito de fazer a pintura. Protelou tanto o quadro que a tela em branco que comprara danificou-se pelo tempo. Sua persistência porém a fez comprar outra tela.
Na semana seguinte, ficaria sozinha em casa durante a semana. O marido já havia falecido e os filhos já criados e com suas próprias famílias estariam ocupados. Além disso, tinha tirado uns dias de folga. Era a ocasião perfeita.
Decidiu fazer um chá de erva doce para ir tomando enquanto pintava. Ligou a televisão na cozinha enquanto esperava a água ferver.
Não acreditou no que seus olhos viam. Uma reportagem passava a respeito de um pintor que era considerado a última revelação dentro das artes, um novo gênio. Posava sorridente para as câmeras ao lado de sua obra prima. O quadro trazia uma pomba sobre a cabeça de um leão. O leão, por sua vez, sobre um edifício ao por-do-sol.

domingo, outubro 03, 2010

O ESTRANHO CASO DE UM AQUÁRIO E UMA MENINA


A menina rezou para chover. Temia que o rio se esvaziasse e faltasse água para o seus peixes do aquário. Ficava muito aflita quando a ração estava por acabar. Não queria passear, viajar, receosa do que poderia faltar aos seus peixes.
Passava horas olhando o aquário. Não por prazer em admirá-lo, mas para certificar-se de que nada saíra do controle. Com o dinheiro de sua mesada comprou duas bombas de ar para deixar de reserva, caso a que estava em uso estragasse.
Quando ela pediu aos pais um sistema de bateria para fazer funcionar a bomba de ar e a iluminação em caso de falta de energia elétrica, eles decidiram leva-la a um psicólogo.
Ela recusava qualquer intervenção da terapia. Acusava o profissional de querer destruir o amor que ela tinha ao seu precioso aquário.
Duas semanas depois, o primeiro peixe do aquário morreu. Apareceu pela manhã boiando, sem nenhuma explicação aparente.
A menina chorou muito por dias. Passou a vestir-se apenas de preto. Entrara num luto sem fim. Ficou conhecida pelo bairro como a viúva do peixe. E assim cresceu.

MINHA GRAMA


Aquele velhinho simpático que todo dia passeava em volta da fonte da praça principal às 8 horas da manhã estava atrasado. Mas vinha com um sorriso diferente e uma maleta à mão.
Parou de frente para o gramado e retirou de dentro da maleta uma toalha de mesa xadrez vermelha. Estendeu-a sobre o gramado e deitou por cima dela ficando com a nuca apoiada sobre as mãos. Ficou assim 20 minutos até que o guarda pediu para ele se levantar, pois era proibido deitar no gramado. O velho apenas sorriu ao se levantar, guardou a toalha na maleta e foi embora para casa.
Chegando em casa, preparou um chá de erva cidreira. Sorveu-o alegremente. Quando sua mulher o encontrou na cozinha, ele disse, animado:
- Minha velha, já sei o que é que me falta!
- Do que você está falando, homem de Deus?
- Vou destruir o jardim de frente de casa e vou plantar grama.
- Por que você vai fazer uma coisa dessas? O jardim está tão bonito e bem cuidado...
- O que eu preciso, na verdade, é de apenas grama. Quero ter minha grama verdinha, macia, que eu possa deitar para pegar sol, que eu veja crescer e precise cuidar melhor do que cuido dessas flores... Não quero todas as cores: o branco, o amarelo, o vermelho, o rosa, o roxo... O verde me basta!
"Pronto,! O homem enlouqueceu de vez!", pensou a velha. Mas achou melhor não dizer mais nada.
Ele passou o dia destruindo o velho jardim e preparando a terra para receber a grama. Cantarolava ou assoviava músicas que inventava naquele instante. Estava muito feliz. Pensava que o que fizera pela manhã foi um prelúdio de sua nova construção de felicidade.
Ele estava certo de que ninguém poderia compreendê-lo em sua escolha de trocar um jardim por um belo gramado. Apenas quem tem uma aguçada sensibilidade percebeu que a grama que sucedeu o jardim parecia mais alegre e mais bonita que seu antecessor. Apenas o velho percebeu que ali nascia uma grama mais verde e mais macia.

sábado, setembro 25, 2010

VINHO TINTO SECO


Ele se vestiu com a melhor roupa que tinha. Saiu com calma e pegou um táxi. Era a primeira vez depois de tanto tempo que ele iria passear num sábado à noite!
Chegou em frente ao restaurante, agradeceu o motorista do táxi, pagou e desceu. Escolheu uma mesa na calçada e pegou um cardápio.
Uma moça de uniforme veio em sua direção para atendê-lo. Quando ela chegou mais perto, exclamou com intimidade:
- Ah, não acredito! Robson?! O que que você está fazendo aqui?
- Ué, estou passeando. Vim jantar!
- Mas logo aqui? Você é louco? Tem tantos outros lugares...
- Pois é... Mas hoje o passeio é por aqui mesmo.
- Só você mesmo pra vir no restaurante em que trabalha no primeiro dia de férias...
Robson era garçon havia 7 anos. Gostava muito da profissão. Através dela, conhecia pessoas, se divertia, convivia com um clima festivo sempre. É claro que tinha seu lado negativo: os clientes chatos, trabalhar no momento em que todos os amigos estão se divertindo...
Pediu apenas uma soda limonada a sua colega de trabalho, que agora lhe tinha como cliente. Olhou no relógio e confirmou as horas. Eram vinte horas e, portanto, estava pontualmente no local combinado.
Na sequência imediata, uma mão tocou-lhe o ombro delicadamente: era Débora. Uma senhora de 52 anos (24 anos mais velha que ele), mas que aparentava ter 40. Era de uma fineza única, denunciando sua procedência abastada. Tinha um sorriso muito belo e olhar cravado na boca de Robson. Eles se conheceram no local de trabalho de Robson, havia exatos dois anos. Ela como cliente e ele como seu garçon.
- O que deseja a bela senhorita?
- Vinho tinto seco, por favor.
Robson percebeu que estava vestida com o mesmo vestido da noite em que se conheceram. Sabia porque havia uma pequena manhca de vinho nele: ele derrubara algumas gotas nela sem querem há dois anos atrás. Segurou-lhe a mão e beijou-a, sedutoramente. Pediram um vinho tinto seco, para rememorar. Conversaram baixo mas alegremente por muito tempo. Era um dia de comemoração. A noite começaria onde a história dos dois teve início e depois iriam a um lugar mais íntimo...
O clima romântico foi quebrado por um homem forte e alto que chegou gritando:
- Ah! Então você está aí? Sua...
Era o marido de Débora. Estava furioso com uma arma na mão, apontando-a ora para Débora, ora para Robson.
- Então este é o seu amante, sua safada?
- Calma Pedro, eu posso explicar...
- Cala a boca! Cala a boca!
Robson ficou paralisado. Não conseguia tomar nenhuma atitude. Lembrou-se dos conselhos que amigos próximos lhe deram, pedindo para que não se envolvesse numa situação de traição conjulgal. Somente naquele momento teve real noção da dimensão de sua decisão.
Tentou acalmar. Em vão. Seu rival nem lhe dera ouvidos.
Alguns clientes ao redor levantaram de suas mesas assustados.
Robson pensava desesperadamente numa forma de resolver aquela situação da melhor maneira possível. De repente, seus pensamentos foram cortados por ruidos secos e fortes. Sentiu uma dor tremenda no peito, ao mesmo tempo em que viu a face de Débora se encher de pavor.
Os três protagonistas cairam sem vida sobre a mesa. O marido em questão de segundos atirou na esposa, no amante dela e depois na própria cabeça. O vermelho do sangue se misturou ao vermelho do vinho tinto seco. Alguém chamou uma ambulância, mas já era tarde.

quinta-feira, setembro 16, 2010

TRI


O casal dançava no meio do salão e se olhavam ternamente. A moça sorria enquanto o rapaz cantarolava a música que lhes embalava os passos.
Era uma cena bonita de se ver. O rapaz, meio duro nos passos por causa de sua perna mecãnica, dançava muito bem, mesmo assim. E era uma música agitada, alegre.
A música parou e as pessoas aplaudiram. Aplausos para a música. Para a festa. Para os dançarinos. Para a vida.
O casal resolveu sentar-se num canto. Pareciam apaixonados. Ele olhava de um lado para o outro, como se esperasse alguém. Mas continuava a conversar com a moça. Sorriam a cada frase de um assunto alegre num dia festivo. Era uma festa de quinze anos.
O irmão da aniversariante aproximou-se dos dois. Ela o abraçou forte, contentíssima por vê-lo e deu-lhe um beijo na boca. Ele olhou ao redor para ver se eram observados e, vendo que ninguém olhava, beijou-o também na boca.
Os três eram namorados havia duas semanas. Era um segredo dos três. Preferiam que as pessoas não ficassem comentando. Não conheciam ninguém que achassem que iria ser um bom confidente, que compreendesse.
Passaram a festa juntos, mas sem levantar desconfianças. No fim da festa, ficaram olhando as estrelas do terraço da casa alugada para festa e cada um voltou pra casa, sozinho. Mas com a certeza de que havia outros corações que aguardavam ansiosos o reencontro.

quarta-feira, agosto 25, 2010

CAMPESTRE


Ela estava correndo atrás de uma borboleta e gargalhando na fazenda do tio. Tinha a liberdade e a alegria da infância tranbordando por seus poros. Só tinha um objetivo: brincar com sua nova amiga borboleta.
O primo, dois anos mais velho, apenas a observava de longe. Ele era muito calado e contido. Não conseguia se envolver tanto quanto sua prima nesse deslumbramento pelas belezas naturais.
De repente, ela parou bruscamente de correr e deu um grito da pavor. Havia uma serpente a sua frente, preparando-se para um bote.
Ele sabia que precisava fazer algo para ajudar a prima. Foi andando até ela calmamente, mas com a agilidade necessária. Chegou ao lado da prima e fez um sinal, pedindo silêncio. Ela obedeceu, tentando controlar o pânico. Ele se ajoelhou e foi devagar se aproximando da cobra. Quando seu rosto estava bem próximo da peçonhenta, sussurou:
- Calma! Ela é só uma garota e não vai te fazer mal...
Ele deu um beijo no rosto coberto de escamas frias, com toda ternura. Em agradecimento, a serpente se enrolou num dos pés dele, como que a abraçá-lo. Depois saiu em movimentos curvilíneos suaves.
A borboleta que a menina perseguia pousou no ombro dele delicadamente. Ele, a prima e a borboleta ficaram parados, completamente imóveis, olhando a cobra se afastar por alguns instantes.

segunda-feira, agosto 09, 2010

VIDA SECA


Olhou no espelho pela manhã e notou que tinha um fio de cabelo branco por ali. Um não: vários! Como não havia se dado conta ainda de tantas "novidades"!!! E as rugas no rosto? Na testa, nos olhos, nas bochechas... Estava aparentando ter quinze anos a mais do que realemente tinha.
E não havia nem sequer percebido que envelhecera tão rápido! Foi assim que percebeu que fazia tempos que não olhava para si com a atenção devida. Tinha deixado de namorar-se como fazia antes.
Um ano atrás, ele passava horas se arrumando para ir na padaria. Comprava sempre as roupas pensando em como estaria apresentável e andava sempre muito bem vestido. Hoje já não demorava mais a se aprontar: vestia a primeira roupa que estava pendurada no cabideiro. Não escolhia mais o perfume que iria usar de acordo com a ocasião: era sempre a mesma fragância quando não se esquecia de usá-la. O corte de cabelo já não era o mais moderno: era sempre o tradicional.
E como tinha adquirido manias! Estava tão mais metódico. Não fazia nada fora do que estava programado em sua agenda. Até os momentos de lazer eram rigorosamente cumpridos. Não ficava até tarde na rua mais, de forma alguma. não trocava mais de canal procurando algum programa na TV. Agora, assistia sempre os mesmos, nos mesmos horários. Parou de bater papo pelo telefone, algo que antes ele adorava.
Como estava diferente! e nem havia notado! Mas logo afastou-se desses pensamentos e foi dar prioridade para a vida prática, que é o que importa, oras!
Fechou o portão, atravessou a rua tranquilamente. Tão tranquilamente que nem viu o carro veloz em sua direção. Foi atropelado.

quarta-feira, julho 28, 2010

ENCOMENDA Nº I


Vou esperar
o tempo que for
pra poder ver
aquele sentimento bom
voltar a ser
só meu.
Ou melhor,
de todo mundo!

ENCOMENDA Nº II


Só eu mesmo
sei o quanto é sério
pra mim
cada brincadeira minha.

ENCOMENDA Nº III


Confie em mim.
Eu nunca vou te machucar
por querer...

ENCOMENDA Nº IV


Eu penso nele,
confesso.
Mas quando lembro
das caixinhas de música
me lembro que é
melhor deixar
esse tal de amor
guardado...

ENCOMENDA Nº V


Falta muito, muito pouco
pra meu grito ficar rouco
e meu coração transbordar
ultrajes não engolidos.

ENCOMENDA Nº VI


Eu seguro o céu,
presto atenção no mundo
e as cores serão
notas musicais!

ENCOMENDA Nº VII


As crianças já nascem adultas.
Mas elas preferem não o ser.
Daí, a gente vem educar
e elas são arrancadas do chão.
Obrigadas a crescer!
Quanta maldade!!!

sexta-feira, julho 23, 2010

402


1 dia
6 vão me dar razão
100 se lembrar porém que
1/4 era o que me prendia.
20 contar que não consegui
1/2 de entender minhas
1001 questões, sozinho como estava.
10ta maneira, fui voar nos
7 ventos e nas incontáveis possibilidades de ser
INFINITO!

sexta-feira, julho 16, 2010

NOSSOS ERROS


Ken axa serto cer umano
cem centir compaichão
du zotros en vouta,
sertamente nãum çabe
aomde çegue errano

CIDADE DE DENTRO


Ah, aquela cidade!
É minha mãe, minha terra amada.
Onde sinto-me seguro
como um pombo num vendaval.
Aquelas casas, aquelas ruas.
Aqueles moleques brincando até tarde.
Aquela praça pequena e bonita.
O ar que eu gosto de respirar.
O campo de terra de futebol.
Os pés de manga, o por do sol.
Entre os cachorros latindo na rua,
entre a turma que volta da escola,
entre os bares em cada esquina
existe uma cidade
filha de seu próprio tempo.

quarta-feira, julho 14, 2010

MÚSICA IMAGINÁRIA


Ele chegou na porta da casa dela com um buque de rosas nas mãos. Estava todo arrumado e com a expressão preocupada. Se houvesse uma trilha sonora para aquele momento, ela seria aquela velha música:

"Não sou perfeito, eu sei.
Mas nunca quis te machucar.
O teu perdão é recomeço.
E quero mais recomeçar.
Não fique assim!
Não seja imune
ao que te peço!"

Ela abriu a porta e quase a fechou na cara dele. Ele impediu, segurando-a pelo braço.
Como num filme mudo, desatou todos os nós que tinha no coração dizendo palavras que ela não escutava. Ela dizia que não queria ouvir. Ignorava o clamor. Pegou as flores e jogou-as no chão com raiva. Dizia para ele ir. Esquecê-la de vez. Fechou a porta e deixou-o lá, gritando o seu nome. Até que ele desistiu e foi embora. Chorando. Ela lá dentro da casa, subiu para o segundo andar. Começou a observá-lo pela janela. Viu todo seu sofrimento. Soltou, sem querer, um sorriso no canto da boca. Um sorriso de satisfação. Se houvesse uma trilha sonora nesta hora, ela tocaria essa nova música:

"Aquilo que eu te disse numa cena ilustre
ficou pra trás como um papel rabiscado.
Só sobrou a pequena dor de ter que cair fora.
E não tem remédio! Tarde demais! Tudo acabado!"

terça-feira, julho 13, 2010

TEM CABIMENTO?


Numa caixinha, a gente guarda
migalhas e o mundo, se a gente quiser...

OS POSTES DAQUI


Ela estava ali na esquina fazia algumas horas. Parecia esperar por alguém. Alguém que não chegava nunca. Olhava no relógio de instante a instante. E nada. A impaciência estava consumindo-a segundo a segundo.
Do outro lado da rua, um jovem sentado no chão com uma caixa na mão. Parecia estar tranquilo, como se o tempo tivesse parado por completo. Olhava as nuvens no céu e parecia adivinhar as formas escondidas em cada uma.
Quem passasse poderia ver opostos em cada lado do asfalto, vivendo um instante monocromático. De um lado filme de suspense. Do outro, um musical.
Até que um bloco passou na rua. Era carnaval. Cores, sons, gente. Muita gente.
A moça nervosa foi atrás do bloco e o homem calmo também. Só ficaram no mesmo lugar os postes. Talvez estivessem cansados, sei lá.

quinta-feira, julho 08, 2010

KAIROS


Eu vi os pássaros.
Pequenos rouxinois
saidos do canto do olho
daquele menino.
Ah! Queria meus seios
embarcardos em suas mãos,
repousando antes da tarde.
Esperando a noite vã,
na qual meus suspiros
de mulher arteira
diriam suaves:
bem-me-queres!
Eu vi as nuvens.
Pequenos chumaços
entrando pelos poros
daquele rapaz.
Ah! Queria um anel
selando aquela promessa
jurada sob as estrelas.
Querendo longe a manhã,
a seresta me silenciava
como moça tímida
que calava nervosa:
bem-te-vi!
Eu vi as cores.
completo arco-íris
dentro e fora dos ouvidos
daquele senhor.
Ah! Queria uma foto
para relembrar os tempos
vividos sob cada sol.
Andando até a tarde,
nenhum som se ouvia
e esta velha seguia
gritava serena:
bem que se quis!

segunda-feira, julho 05, 2010

LIBIDO


Sinto um pulsar louco
de vida que quer propagar!
Os olhos, como um radar,
esperam a presa
sedenta do caçador.
O cheiro me sobe,
num calor vertiginoso,
e explode na saliva
uma vontade louca
de sentir aquele gosto
e a textura de pele
mais (de) uma vez.

TU, INGRATA!


Se na calada da noite
queres me alcançar calada,
eu tento escapar
para sobreviver.
Como um gemido preso
pelos lábios selados
entre pudor e o prazer.
Ah, doida agonia!
Por que castigas
assim a quem amas?
Ou sou somente eu
que enxergo em ti um amor?
Tu, ingrata companheira,
visitas-me numa surpresa
e invades gentilmente
um espaço que ultimamente
já espero ser seu.
Será que me apeguei a ti?
Ou será que criei um vazio
no que deixou de ser eu?

sexta-feira, junho 25, 2010

A DOCE CARNE VIVA


Eu falei, avisei,
antecipei cada cena...
Vai você agora
dizer que era surto...
Um copo de leite
bem quente e com canela.
Havia um presente na gaveta.
E se a frase não parasse na interrogação...
Foi tudo um murro
que pousou suave em minha boca.
Um ponto e vírgula que saiu num erro!!!
A pomba voa pela janela.
Já se passaram cinco minutos.
Esta não é sua cor favorita?
O delírio talvez me amanse
como uma fera que vai na esquina
comprar um jornal e o pão.
O que procuras nas palavras tortas?
Eu só tenho a incompreensão!

segunda-feira, junho 21, 2010

O BOSQUE ENCANTADO


De um impulso solar,
a luz correu o céu
e brotou bonita
naquela cortina azul
hoje pela manhã.
As árvores cantavam,
os pássaros contemplavam,
as cigarras dançavam
e o menino sorria.
O verde cutia
inundando o ar,
pensa feliz
em ser deus.

segunda-feira, junho 14, 2010

CAFÉ DA TARDE


Na copa:
- Abra um bom sorriso! Comigo! Isso! Boa boneca você é...
Na cozinha:
- Veja só: ela já tem 7 anos!
- Que menina mais linda!!!
-O tempo passa rápido, não é?
Na copa:
- Vamos estudar mais um pouco?
Na cozinha:
- Bom seria se ela tivesse uma irmãzinha...
- É, mas meu marido não quer mais crianças...
- Mas ele pode mudar de ideia, não é?
Na copa:
- Mamãe, você pode dizer para essas suas amigas que vocês falam alto demais? Assim não posso ser professora...
E o riso foi geral

CANIS LUPUS


Pode abrir a porta.
Vá embora agora.
Não espere um segundo sequer.
Um discurso pronto.
Um breve adeus.
Não quero mais maus amigos.
Viro a página.
Mas guardo a mágoa.
Fico melhor longe do lobo.

quinta-feira, maio 27, 2010

EU, UM HOMEM DE FERRO


Minha proteção contra o mundo
me define mais do que o que tenho por dentro.
É um escudo que uso como arma.
Eu achava que eu era um cara bom.
O que eu tenho no peito é Paládio.
O que me faz ser o que sou
é a razão da minha dor.

quarta-feira, maio 12, 2010

COMUNHÃO


Registre aqui o seu palavrão!

CASA DO ADEUS


Se se pede pequenas luzes,
quer que fique a escuridão?
Seus olhos estão vendados,
mas quem quer mudar isso?
Já quis entender.
Desisti de entender.
Agora, francamente,
faço questão de não entender.
Deixa eu apagar a luz.
Deixa eu jogar o véu.
Deixa eu cegar a vista
e a faca também.
A ferida agora vai ser
fruto do que não se vê.

sábado, maio 08, 2010

MÉLA REV


,aossep a icehnoC
.arodatnacne siam a sadot ed
!aidneerpmoc em omoC
.ós mu esauq somarÉ
:edadrev a iv ue euq étA
oxelfer uem sanepa are
...onilatsirc ogal mun

PARQUE DO ARREBOL


__Vejoooooooooooooo_
_booooooooooolas de_
____sabãoooooooooo__
__subindoooooo______
__nooooo__ventooooo_
_____rumooooooooo___
_aooooooooo_________
_____soool__________

PALÍNDROMO


O aval é ágil. Liga e lava-o.

TODOS OS SANTOS


São jorge afundou meu barco.
Ogum cuspiu no prato em que eu comia.
Sheila debochou das minhas palavras.
Uriel atirou 7 pedras em mim.
Tupã bateu com um porrete na minha cabeça.
Diana abafou minha voz nascente.
Kiam lançou sobre mim uma maldição.
Mas o que mais doeu foi quando
eu mesmo resolvi me machucar.

VOGAIS


-Ah, é?
- Ô...
-Uai... Óia aí!
-Ih!!! É uó!
-Uh!...

quinta-feira, maio 06, 2010

FONTE DOS DESEJOS


É só um palito de fósforo.
Aproveito o seu calor.
A água goteja no copo.
Bebo com satisfação.
É pouco, mas é o que brota da nascente.
Gloria in excelsis Deo.

sábado, maio 01, 2010

VISTA VERMELHA


O metrô é um lugar feito para os flertes. Os bancos ficam em posições em que é quase impossível que todo mundo não se olhe.
E foi assim que eu a vi. Linda. Usava um vestido bem justo, todo de vermelho. Os cabelos ruivos, soltos.
Era impossível não notar que ela estava com um sorriso diferente. Nunca tinha pousado meu olhar nela, mas aquele sorriso era diferente de todos os que eu já havia visto.
Ela se levantou para desembarcar numa estação antes da minha. Não titubiei e saltei do trem ali também. Corri para alcança-la no meio da multidão que subia as escadas daquela estação. Dei três tapinhas de leve em seu ombro direito. Ela parou, se virou e me olhou com um jeito enigmático.
Perguntei:
- Por acaso você não é a irmã da Janete?
Inventei o nome na hora, só para puxar papo mesmo.
- Não, não tenho nenhuma irmã... Mas você é o Adão, certo?
Como ela sabia meu nome? Seu rosto não me era familiar. Eu, como um bom fisionomista, me lembraria, caso houvéssemos cruzado o caminho um do outro... Respondi, surpreso:
- Sim, sou eu...
- Ah, pois é... Tenho algo pra você...
Fiquei muito intrigado com tudo aquilo. Ela procurava algo dentro da bolsa e me entregou dizendo:
- Pegue!
Era uma maçã. Dito isto, ela virou as costas e saiu andando sedutoramente, enquanto eu, maquinalmente, olhava-a com assombro e mordia o fruto que estava em minha mão.

quinta-feira, abril 22, 2010

COMPLETE...


Eu pensei que...
Por isso decidi que...
A palavra mais doce, enfim é...

CAÇA PALAVRAS


POUCOADIANTOUACENDERCIGARROSFALARPALAVRAOPERDEREU
BEMQUESEQUISDEPOISDETUDOAINDASERFELIZMASJANAOHAJA
EUQUISPLANTARMINHACANCAOILUMINADADEMASASPESSOASNA
CONTAPRAMIMOQUETEFEZCHORARNUNCAMAISQUEROTEVERMAIS
TRSITEZANAOTEMFIMFELICIDADESIMFELICIDADENAOTEMFIM
POSSOESTARSOMASSOUDETODOMUNDOPOREUSERSOUMANEGARSO
TUDONAMAISPERFEITAORDEMTUDONAMAISSANTAPAZSANTAPAZ
UMNOVOTEMPOAPESARDOSCASTIGOSESTAMOSCRESCIDOS1NOVO
APESARDEVOCEAMANHAHADESEROUTRODIAAPESARDEVOCESERA
PRESENTEMENTEEUPOSSOMECONSIDERARUMSUJEITODESORTE!
EHOJEODIADAALEGRIAEATRISTEZANEMPODEPENSAREMCHEGAR
DIGAESPELHOMEUSEHANAAVENIDAALGUEMMAISFELIZQUEEUEU

NÃO OUÇA, NÃO CALE


Eu e minha densidade,
que varia como as luzes no céu,
somos incompreensíveis e imponderáveis.
As vozes que me massacram
fervilham por aí.
Tentar me entender? Pra quê?
Não é pra me ajudar, isso eu sei!
Aliás, não estou mendigando compaixão.
Estou muito bem onde estou.
Espero que a distância se mantenha,
se não for sincera a mão estendida.
Não quero ter mais amigos.
Basta-me as antigas companhias,
ainda que ausentes...
Para alguns, só mesmo a poeira...
Se me faço pesado, caio em pústulas.
Se fico leve, flutuo em cântigos.
As minhas chagas são tão minhas,
deixe estar!
Minhas alegrias são tão nítidas,
veja só!
E só veja.
Leve o punhado que conseguir carregar.
Mas não me tome o que é meu.
Não entre na porta cerrada.
Se o ar fica mais pesado,
não queira me acariciar.
Não preciso de piedade.
Não sou alimento para sua infantil vontade.
Não estou no papel de te ensinar.
E chega de leviandade.
Não leve recado.
Não tire o recado de onde não tem.
Isso é só um aviso.
Uma explosão contida.
Uma batida de asas de borboleta.
Um encontro casual no domingo.
Uma fuga do porão em disparada.
Uma bola de sabão que se esmigalha.
Uma lâmina que se enferruja guardada.
Um tijolo esquecido no quintal.
Um riso sarcástico de fada.
Uma roupa de plumas de pavão.
Um rosto que foge do retrato.
Uma gaita desafinada.
Um inimigo invisível autocriado.
Um cortejo de um pássaro ferido.
Uma lástima derramada...
Um exagero desnecessário.
Um sim dito em resposta ao não.
Um nada de muitas palavras.

quinta-feira, abril 15, 2010

TÃO ANTIGO QUANTO ATUAL


Ela acordou atrasada para o trabalho e logo no primeiro dia! Saiu da câmara de regeneração, trocou de roupa e foi tomar a primeira refeição do dia numa lanchonete no caminho, porque o sistema operacional de sua cozinha estava com um vírus desde a semana passada.
Pegou um aerotáxi para chegar à tempo. Aportou na recepção em cima da hora e foi conduzida ao setor de cadastro biométrico para ter acesso às portas que a levariam ao seu setor. Após o cadastro e passar por várias portas, chegou à sala de pesquisa e criação. Calçou as luvas e colocou os óculos de imersão do ambiente de criação virtual interativo e foi apresentada à equipe de trabalho.
Ela era uma nanoengenheira de microchips recém formada que estava feliz em conseguir seu primeiro emprego.
Um rapaz da equipe lhe chamou a atenção. Era jovem, também recém formado e estava na equipe havia dois meses apenas. Ele tinha um semblante muito triste. Não tinha a energia característica de quem começa uma carreira que lhe agrada.
O expediente de trabalho correu tranquilamente. No último intervalo, ela se aproximou dele na sala de descanço e revigoramento cerebral. Ele estava deitado na maca biomagnética de olhos fechados. Com um certo receio, ela resolvou deitar-se na maca biomagnética ao lado e puxar um papo.
- O dia de trabalho é sempre agitado assim?
- Não. Hoje é segunda-feira e por isso é mais corrido.
- Você é recém formado também certo? Onde estudava?
- No Centro de Estudos Virtuais de Belo Horizonte.
- Sério? Meu irmão mais velho estudou lá também!
Em pouco tempo ficaram amigos. As semanas correram e ele sempre com aquele semblante triste. Até que, numa conversa na sala de descanso e revigoramento cerebral, ela perguntou:
- Bom, sei que não é da minha conta, mas desde que entrei aqui, achei você um pouco triste... É algo em que posso ajudar?
- Oh, desculpe. Está tão evidente assim? Eu não queria...
- Não se preocupe. Só perguntei porque pensei que uma conversa poderia lhe fazer bem...
- Ah, não se preocupe! É só o fim de um relacionamento. Vai passar...
- Tudo bem, se quiser falar, estou aqui!
- Obrigado!
Neste dia, ele foi para casa mais aliviado por se sentir amparado no mundo. Ela foi mais tranquila por saber que tinha um amigo com quem dividir os pesos desses tempos modernos.

sábado, abril 10, 2010

A COR DO INVERNO


O frio vem chegando e me traz lembranças diversas.
Lembro-me de coisas diferentes de quando eu paro pra pensar
nas minhas lembranças de inverno.
Eu estou diferente também.
Sinto que o frio não vem contra mim.
Sinto a minha pele buscar abrigo no agasalho.
Sinto que as folhas não caem mais porque a vida morre.
Sinto que é uma forma das árvores enfeitarem o chão.
Como se fosse uma primavera de cores pálidas.
Como se a alegria estivesse mais contida.
Porém ela está aqui!

POR UM DETALHE


Nós todos somos tão iguais.
Nossa diferença é muito sutil.
Uma vírgula no meio de tanto a se dizer.
- Não, mais!!!
- Não mais!!!